quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Sem ver o que sou, sem ouvir aquilo que digo, sem viver aquilo que penso, sem sentir aquilo que me és, sem sentir o meu coração


   Sem ver o que sou, sem ouvir aquilo que digo, sem viver aquilo que penso, sem sentir aquilo que me és, sem sentir o meu coração. Era assim que a nostalgia do meu quarto me deixava, era assim que a música fuzilava alegremente os meus ouvidos, era assim que o cenário que impus me mantinha durante todas as simples e inesquecíveis noites sem dor, noites em que eras minha por momentos, por horas, por séculos, era assim que eu era, ora contigo, ora sem ti, e logo depois contigo de novo, era neste desconcertado estado que o teu amor fingido me deixava nessas noites sem sono e sem ti, contigo e sem sono, era assim que eu era em todos os sonhos que vivi e idealizei, que vi e criei, que te dei e senti. E foi nesses sonhos, nessas noites sem sono e sem dor, nesse cenário, nessa música, nesse quarto, que eu descobria que te tinha, que eras verdadeiramente minha, que a tua beleza era o brilho dos meus olhos, que o teu sorriso era o bater do meu coração, que os teus eternamente simples olhos eram a força do meu viver, descobri que o teu amor era eu, que eu era o teu amor, que me tinha dentro de ti, dentro de mim, descobri que todo eu era teu, que o meu fiel amigo cérebro era a frieza do teu corpo, que a minha desconhecida alma era gémea da tua, mas que eram mais que irmãs, descobri que o meu traiçoeiro coração era mais que teu, era de ti, para ti e apenas teu, descobri que eras a máquina perfeita que dentro de mim não podia parar, descobri que tu eras eu, e que eu era tu, que estavas dentro de ti, que eu existia dentro de ti, e tudo isto pareceu morrer naquela quinta-feira de manhã, em que saí do jardim perfeito, em que deixei de te ter em mim, em que morri e receei não te ter mais, em que tudo o que vivi e idealizei, que vi e criei, que te dei e senti desapareceu, e só a minha memória e o teu coração relembravam, naquela quinta-feira de manhã em que a minha morte foi contada pela tua voz a dizer “bom dia” e por um beijo matinal que nos fez novamente um, que me fez novamente adormecer...

1 comentário:

  1. Gosto muito, mas mesmo muito de te ler. Bendita a hora em que lembrei de te aconselhar os livros de José Luís Peixoto, porque é notável - e notório - a influência do seu estilo confessional, repetitivo mas com intenção estética, altamente emotivo e visceral.

    Nota-se que sabes fazer bons malabarismos verbais - gostei deste, em particular: «a minha desconhecida alma era gémea da tua» - e poetizas coisas do dia-a-dia, coisas simples mas profundamente simbólicas.

    Parece-me que já estás à altura de te estenderes um bocadinho mais: manteres este teu bonito estilo poético e expandi-lo por alguns parágrafos, tentando manter o texto coeso e coerente, sabendo conciliar bens as repetições anafóricas com uma extensão mais prolongada do texto, sem torná-lo excessivo ou muito denso. Sem dúvida alguma, tens aquilo que gosto de ler numa crónica literária: sabes conciliar prosa e poesia e ser vulnerável e humano. E só tens 15 anos! (Não 16, disseste-me agora mesmo!) xD

    É apenas uma proposta para te arriscares um bocadinho mais (não sou escritor, muito menos professor de escrita criativa, daí os meus comentários poderem ser um autêntico tiro no escuro.)Penso - e isso já tenho vindo a notar nos teus outros textos - que deves prestar atenção à fase de revisão: falha-te sempre uma vírgula ou um acento ou qualquer coisa mal teclada (nota-se que é pura distracção tua, mas fica só aqui o "alerta"!) :)

    Tens muitas coisas espantosas a explodir dentro de ti! :)

    Este texto é mais uma espantosa parte desse teu incrível fogo-de-artifício!

    Um abraço e é sempre uma honra, pá!

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